Fundamentos
A miocardiopatia não compactada (MCNC) é uma doença genética rara de prevalência indeterminada. O quadro clínico é variável, sendo insuficiência cardíaca (IC) a manifestação mais comum. Eventos embólicos ou arritmias ocorrem mais tardiamente ou como consequência.Apresentamos um caso em que a clínica inicial foi de parada cardiorrespiratória (PCR).
Relato do Caso
Masculino, 59 anos, hígido, apresentou uma PCR extra-hospitalar por arritmia ventricular, foi reanimado pela equipe de resgate e encaminhado ao hospital. Foi realizada cineangiocoronariografia coronária, sem lesões obstrutivas. Ecocardiograma transtorácico (ETT) demonstrou hipocinesia difusa do ventrículo esquerdo (VE) com dilatação de câmaras esquerdas (átrio esquerdo com 46mm e diâmetro diastólico do VE com 70mm) e fração de ejeção do VE de 32%. A ressonância magnética cardíaca (RMC) evidenciou realce tardio mesocárdico em paredes septal e anterior e relação miocárdio compactado/não compactado diagnóstica de MCNC. O Holter identificou extrassístoles ventriculares polimórficas frequentes (132/h) e episódios de taquicardia ventricular (TV) não sustentada. O paciente foi submetido a um estudo eletrofisiológico (EEF) no qual foi induzida TV monomórfica com instabilidade clínica e necessidade de cardioversão elétrica. Devido a manifestação clínica inicial e diagnóstico definido, foi implantado cardiodesfibrilador (CDI). No seguimento, paciente apresentou episódios de TV sustentada, recebeu choques do CDI e, posteriormente, fez ablações de TV em 2007 e em 2015. Atualmente encontra-se estável e assintomático, sem novas arritmias, mantendo disfunção ventricular esquerda e está em terapia clínica otimizada para IC.
A MCNC é uma doença de diagnóstico crescente na prática clínica e tem apresentação amplamente variável. Consideramos interessante a descrição deste caso por se tratar de um paciente com manifestação inicial de PCR e destacar a importância de estar sempre atentos às distintas formas de apresentação clínica da doença. O diagnóstico é realizado pela identificação, habitualmente em ETT ou RMC, de aumento na relação miocárdio não-compactado / compactado. O tratamento baseia-se na apresentação: pacientes assintomáticos são acompanhados regularmente e aqueles com manifestações clínicas são tratados conforme a clínica.