Fundamentação: Existe controvérsia se o uso de inibidor da enzima conversora de angiotensina (iECA) ou uma terapia bloqueadora de receptores da angiotensina (BRA) no pré-operatório está associado com resultados adversos após cirurgia cardíaca. Diretrizes atuais afirmam ser incerta a segurança da administração pré-operatória destes medicamentos devido às possíveis consequências deletérias de hipotensão no peri-operatório.
Objetivo:Determinar o efeito da terapia pré-operatória com IECA ou BRA nos desfechos a curto prazo da cardíaca cirurgia.
Métodos: Coorte prospectivo de centro único entre janeiro 2018 e Dezembro de 2019. Os pacientes eram elegíveis se foram submetidos à cirurgia cardíaca eletiva com circulação extracorpórea e idade ≥ 18 anos. Os pacientes foram divididos em dois grupos de acordo com o uso prévio do ACEi ou BRA. Todas as variáveis demográficas, clínicas e cirúrgicas pré-operatórias foram coletados prospectivamente. Os resultados de interesse foram mortalidade na unidade de terapia intensiva (UTI), incidência e duração (horas) de choque pós-operatório (definido como a necessidade de vasopressores ou inopressores intravenosos), lesão renal aguda (LRA) no pos-operatório (definida como duplicação da creatinina sérica), duração da ventilação mecânica (horas) e tempo de permanência na UTI (dias). Foi realizada regressão multivariada para resultados categóricos e teste de Kruskal-Wallis para variáveis contínuas não paramétricas.
Resultados: Foram avaliados 353 pacientes no período, 182 (51,6%) do sexo masculino, com idade média de 54,5 anos (± 14,7) e mortalidade prevista pelo STS e EUROSCORE de 1,93 (± 1,81) e 1 89 (± 1,9), respectivamente. A cirurgia de revascularização do miocárdio foi o procedimento mais comum, 168 (47,6%). Após regressão multivariada, o uso de IECA ou BRA no pré-operatório foi associado ao choque pós-operatório: RR: 2,03 (IC 1,25 - 3,30), p = 0,004; incidência de LRA: RR: 2,84 (IC 1,01 - 7,98), aumento do tempo de permanência na UTI: 4 (3 - 6) vs 3 (2 - 5), p = 0,03; e aumento da duração de choque: 10 (0 - 39) vs 0 (0 - 24), p <0,01. Não houve associação com a duração da ventilação mecânica: 10,5 (6 - 20) vs 11,0 (5 - 18), p = 0,31 ou mortalidade na UTI: 14 (7,3%) vs 16 (10, 0%), p = 0,44.
Conclusões: O uso de IECA ou BRA pré-operatórios foi associado ao aumento da incidência e duração do choque pós-operatório, incidência de lesão renal aguda e durações da ventilação mecânica e permanência na UTI.