INTRODUÇÃO
A doença meningocócica é uma doença infecciosa de alta mortalidade, principalmente quando não tratada precocemente. Manifestações extra-meníngeas são raras (17%) e o envolvimento pericárdico é ainda mais incomum (3%) e frequentemente grave.
RELATO DE CASO
Paciente do sexo feminino, 38 anos procurou PS com queixa de febre, mialgia, artralgia, cefaleia, odinofagia e erupção cutânea purpúrica há um dia da admissão. Foi atendida inicialmente em serviço primário e recebeu alta após exames de sangue e uma dose de penicilina benzatina intramuscular, sem informações sobre o diagnóstico nesta ocasião.
Após 1 semana, por apresentar piora dos sintomas, procurou atendimento em outro serviço. O exame físico desta ocasião evidenciou taquicardia, rigidez de nuca, artrite e pulso paradoxal, sem instabilidade hemodinâmica. A radiografia de tórax evidenciou cardiomegalia e o eletrocardiograma taquicardia sinusal. Frente aos achados foi realizado ecocardiograma beira-leito que confirmou o diagnóstico de derrame pericárdico volumoso com sinais de restrição, como colabamento de câmaras direitas e ausência de variabilidade da cava.
Foi indicada pericardiocentese e, pela cefaleia com rigidez de nuca, realizada também coleta de líquor. Ambos os materiais apresentavam aspecto purulento, e as culturas identificaram Neisseria meningitidis. A paciente foi tratada com ceftriaxone endovenoso e drenagem pericárdica, apresentando boa resposta clínica. Recebeu alta hospitalar assintomática e sem sequelas.
DISCUSSÃO
Habitualmente a doença meningocócica é de evolução rápida, com piora dos sintomas em poucas horas. Nesse caso, como a paciente recebeu antibióticos de longa duração (penicilina G benzatina) no início do quadro, a doença apresentou um curso insidioso e, portanto, um diagnóstico tardio. O uso do ecocardiograma beira-leito mudou a abordagem do caso e agilizou o diagnóstico do quadro cardíaco. O derrame pericárdico é uma complicação rara (3% dos casos) e frequentemente grave da doença meningocóccica, podendo ser resultado de reação imune ou por presença direta do patógeno, como no caso descrito. A evolução para tamponamento cardíaco é ainda mais incomum, com poucos relatos de caso, e potencialmente fatal. Este caso ilustra uma piopericardite meningocócica com tamponamento cardíaco, apesar da falta de sinais clínicos de instabilidade hemodinâmica. Essa apresentação incomum da doença meningocócica reforça a valorização do exame físico e da investigação direcionada para diagnósticos diferenciais raros.